dezembro 03, 2004

Marcos 1.14-15

De acordo com Marcos, João Baptista não terá tido um ministério muito prolongado depois que baptizou Jesus no rio Jordão. As razões da sua prisão estão narradas no mesmo capítulo seis que fala da sua morte também. Apesar de primos em segundo grau, Jesus e João, o Baptista, ter-se-ão encontrado poucas vezes; se tal aconteceu porque não nas festas anuais em Jerusalém para onde concorriam todos os bons judeus vindos do norte (a presença de Jesus nas festas no templo aos doze anos será uma indicação plausível da sua regular assistência pelos anos subsequentes). Certamente!
Marcos regista de forma documental a acção de Jesus logo que soube que João havia sido preso. Sendo por demais evidente para Jesus que JB não sairia com vida do cárcere, O Filho de Deus inicia o Seu ministério terreno indo para as bandas da Galiléia Norte. Coincidência ou não, perguntamos a nós mesmos:- "porque não foi Jesus para a Judeia, local onde JB tinha semeado O Evangelho do arrependimento"? É apenas com um sentido geográfico em mente que o nosso Salvador inicia o seu ministério em terras da Galiléia, de forma a dar uma cobertura maior à extensão do sentido do Reino de Deus? O espaço é pouco para apontar algumas boas razões. Creio, porém, haver aqui um sentido missiológico que se nos escapa.
Todo o judeu, ainda que não fosse versado nas leis sabia que Galileia significava "o círculo dos incrédulos". Era a província onde sempre predominou a maior mistura de raças. Quem eram, na sua maioria, os habitantes da Galileia? Eram os chamados "am-ha-arez"? Quem eram os "am-ha-arez"? A palavra significa "o povo da terra". Ao longo dos anos a variedade de grupos humanos que habitaram esta parte da Palestina foi grande. Para os definirmos historicamente teríamos de voltar aos tempos de Abraão e fazê-los passar pela ausência dos judeus na Babilónia, altura em que as terras da Palestina foram ocupadas por povos diversificados: samaritanos, arameus, filisteus e mesopotâmios. Os judeus conhecedores da história, rabinos e doutores da Lei, sacerdotes e demais do tempo de Jesus ainda mantinham na memória e no coração imperdoado a usurpação das terras por parte de todos estes grupos. Esses que permaneciam na Galileia no tempo de Jesus eram os "am-ha-arez" da História. O conceito atribuido aos "am-ha-arez" era fortemente negativo por parte dos fariseus e demais grupos religiosos, políticos e sociais. Ora Jesus foi inclusivamente considerado pelos principais dos sacerdotes e fariseus um "am-ha-arez" conforme as palavras de João 7.49-52. De acordo com eles, jamais Deus usaria notoriamente um "am-ha-arez" - "Examina e verás que da Galileia não se levanta profeta". O engano da classe religiosa dos tempos de Jesus foi abismal. Dentre os residentes da Galileia, "o povo da terra" haveriam de surgir inúmeros corações predispostos, abertos à mensagem anunciada pelo Salvador - "o tempo está cumprido e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no Evangelho".
É uma motivação missiológica a que leva Jesus Cristo à Galileia. Ali residiam os corações despidos de preconceitos para com o Messias, carentes e sensíveis à chamada para o Reino de Deus. Destes se formaria uma classe de discípulos que jamais deixariam de cobrir o mundo com a mensagem de arrependimento e de fé na Boa Nova anunciada pelo Salvador. Desde cedo, O Salvador, entendendo que "veio para o que era seu, mas os seus não o receberam", tratou de ir ao encontro dos tinham um espaço para Ele nas suas vidas. E "a todos quantos o receberam deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que crêem no seu nome" (João 1.11-12). Que gloriosa estratégia!