outubro 14, 2004

Marcos 1.9-11

De forma humilde o nosso Salvador desceu às águas do rio Jordão a fim de seguir o caminho dos pecadores e ser baptizado por João. Marcos limita-se a dizer: "Naqueles dias, veio Jesus de Nazaré da Galileia e por João foi baptizado no rio Jordão" (1.9). Nada de cerimónias! Juntamente com homens e mulheres, pecadores arrependidos, Jesus desceu às águas do baptismo (eu sou dos que ainda escrevem baptismo com "p").
Ao longo dos séculos, a prática do baptismo assumiu uma posição de destaque em matéria teológica. Creio que isso se deve ao mau uso que o catoliscismo deu à questão do baptismo, originando fortes reacções por parte dos puritanos e protestantes. Nada no texto bíblico parece reforçar o papel do baptismo na salvação! Não sendo o baptismo uma prática origináriamente cristã, havendo anteriormente a João ritos e práticas religiosas que incluiam o baptismo nas suas cerimónias, o que leva João, o Baptista, a adoptar o baptismo como uma prática técnica no seu ministério, dando-lhe um novo e expressivo significado. Através do baptismo, o pecador exprimia exteriormente o arrependimento do seu afastamento do Deus da Nação e a crença na vinda do Messias. A diferença da pregação evangélica é que João apontava para o Messias que havia de vir e nós hoje apontamos para o Messias que já veio e que retornará certamente! O sinal exterior e público, manifestado pelo pecador arrependido, não creio que tenha sido perpetuado até os nossos dias pela Igreja Cristã por causa do exemplo de João, mas mais por ordem do Senhor Jesus Cristo, deixada particularmente em Mateus, capítulo 28 e verso 10.
A concordância de Jesus com a prática do baptismo, apesar de João insistir que não o baptizaria (Mateus é o único dos escritores sinópticos que nos fala desta parte), e a sua ordem dada a todo o discípulo para que baptize o pecador em nome da Trindade, traz para o Cristianismo a importância do baptismo como uma evidência do que a fé produz no coração daquele que deseja ser discípulo de Jesus Cristo - "todo o que crê seja baptizado", "é lícito se crês de todo o teu coração".
A pergunta sempre permanece: "Não precisando Jesus de evidenciar sinais exteriores de arrependimento, porque desceu Ele às águas do Jordão e foi baptizado por João?" A simples resposta: "foi para se identificar com a necessidade do homem pecador" não é suficiente (alguns vão mais longe dizendo outras coisas que entram no campo da heresia); outros teólogos dizem que Jesus, ao aceitar o baptismo de João, estaria a aceitar o baptismo da sua morte (curiosamente, o apóstolo Paulo faz em Romanos 6.3 uma relação muito interessante sobre o significado do baptismo na morte).
Na descrição de Mateus, a hesitação de João em baptizar Jesus é absolutamente legítima. Faz sentido! João argumenta - "eu tenho necessidade do teu baptismo com o Espírito e fogo e tu vens ao meu baptismo de água?". São interessantes as palavras de Jesus em resposta a João: "deixa por enquanto porque assim nos convém cumprir toda a justiça" (3.15). Que justiça? A da Lei? Seria o baptismo o novo acto de circuncisão do pecador? Ninguém quer entrar por aí!
Parece-me, contudo, demais evidente que a decisão de Jesus ao descer às águas é um acto de certificação (desculpem a palavra) do ministério de João! Foi um contributo Seu de forma a conferir autoridade e legitimidade ao ministério de João Baptista; era uma maneira de concordar e cooperar com o ministério de João! Jesus inicia o Seu Ministério com o baptismo e termina-o com a ordem sobre o baptismo. Interessante!
O acto de certificação é devolvido por Deus-Pai a Jesus-O Filho, quando Ele ainda em oração (Lucas é o único que nos fala da oração), permanecendo nas águas, os céus se rasgam e uma voz certificadora diz: "Tu és o meu Filho amado em Quem tenho muito prazer". Há uma dupla certificação no baptismo de Jesus: Jesus certificando o ministério de João através do acto da participação no baptismo e conferindo-o mais tarde ao Seu Corpo-a Igreja, e a Trindade certificando o ministério de Jesus através da voz do Ceú e a presença corpórea do Espírito Santo.